A pergunta do título
faz jus em quase todos os momentos já vividos ao longo dos 25 anos desde a
promulgação da “Constituição Cidadã”. De tão cidadã, foi rasgada pelo Ministro
Joaquim Barbosa, em ato fotografado que circula pelas redes sociais. Temos uma
Constituição? Ou o que foi rasgado é apenas papel para ser reciclado?
O texto promulgado em
05.10.1988 contém hoje 250 artigos, 97 artigos das Disposições “Transitórias”
(a transitoriedade continua sendo emendada até hoje) e cerca de 66 emendas. Se
contarmos todos os itens – artigos, parágrafos, incisos, letras, incisos dos
parágrafos, parágrafos dos incisos, etc., teremos mais de 3 mil itens!
Passados 25 anos,
quase 2/3 do texto total precisam ser regulamentados. O que significa que nada
valem! E não valem porque não podem ser aplicados. São figurativos enquanto o
final do processo legislativo desde o ato da regulamentação por lei ordinária, passando
pelo decreto de regulamentação, chegue até a portaria, ato normativo, resolução
ou instrução normativa. Pior ainda é pensar que a Carta Magna depende de uma
portaria para ter validade. Na prática, é menor do que a portaria.
Não é à toa que leis
e decretos se avolumam de forma inconstitucional, até mesmo sobre artigos que
teoricamente não precisariam ser regulamentados, já que inexiste ordenamento
expresso neste sentido em vários deles. Um dos exemplos são os incisos 53 e 54
do artigo 5º que dizem:
LIII - ninguém será
processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
Ora, muitos
brasileiros já tiveram seu veículo apreendido por uma autoridade administrativa,
sem mandado judicial, em blitz policial pela simples falta de pagamento de
algum tributo relativo. A lei que impôs a vassalagem do Estado não respeita o
que está na Carta Magna. Certa vez perguntei a um oficial comandante (Oficial
de Dia) de um quartel da Polícia Militar no Paraná se ele havia jurado a
Constituição e, na afirmativa dele, perguntei-lhe por que não a respeita. Ele
me respondeu que tem seguir a lei. Mas e a Constituição, o que é – ou seria? Maior ou menor do que a lei?
Outro exemplo, diante
dos registros de novos partidos, é o art. 17, cujo texto não encaminha para
regulamentação para uma absurda lei (9.096/95) que impõe uma flagrante
desigualdade aos cidadãos que querem criar um partido político, exigindo-lhes
centenas de milhares de apoiamentos, com assinaturas manuais, contendo titulo
de eleitor e que ainda devem ser autenticados em cartórios zonais eleitorais.
Estes, por sua vez, assumiram função notarial sem que exista disposição legal
nesse sentido, ao recusar autenticação para assinaturas que não conferem com a
do titulo ou da ultima eleição. Pode? No Brasil, uma portaria, que expressa a
volúpia burocrática que justifica a contratação de mais de 150 mil novos
funcionários públicos em vagas abertas em concursos públicos somente este ano
(segundo jornais de concursos) ou ainda que impõe vontade política para
defender interesses corporativos, vale sim, mais do que a Constituição. Haveria
muito a citar sobre as tantas infringências que embargam a garganta dos
brasileiros que pagam a mais alta carga tributária sobre produtos do mundo.
Mas, são 3 mil itens... e um terço deles é desrespeitado tendo como maior
exemplo o Governo Central e agora, os dois outros Poderes também.
A tal constituição é
também, a oitava desde 1824. E é assim porque nunca houve no País, uma
Constituição de Princípios, pois, infelizmente, os Positivistas do final do
Século XIX introduziram seus preceitos de tal forma que até a Bandeira do
Brasil está positivada com uma expressão escrita cujo conceito – Ordem e Progresso - inexiste na terra brasilis. E os constituintes
de 1988 se esmeraram em positivar tudo que foi possível, tornando a Carta, a mais analítica do
planeta. E que ainda precisa ser regulamentada para detalhar o detalhe, do
detalhe, do detalhe. Não é à toa que, segundo o IBPT – Instituto Brasileiro de
Planejamento Tributário – já se tem mais de 4 milhões de normas legislativas
produzidas nas zelosas três esferas governamentais, sendo mais de 40% delas,
inconstitucional, segundo matéria de uns 5 anos atrás da Revista Exame.
Montesquieu, que ensinou que “leis demais inutilizam as necessárias”, deve ter
partido para outra galáxia, para não ver o que estão fazendo com o Espírito das
Leis.
A atual constituição deve ser inteiramente
substituída por um novo texto, de
Princípios, referendado pelos pagadores da conta e verdadeiros donos do
País – o Povo. Três preceitos, além dos Direitos Naturais da Vida, da Liberdade
e da Propriedade, devem nortear este novo e definitivo texto: o Princípio da
Constitucionalidade prevalente sobre a democracia e “vontade política” (Estado
de Direito), o Princípio da Subsidiariedade – que orienta a maior autonomia da
menor localidade, onde residem as pessoas, até a menor autonomia da maior, mas
necessária, abstração jurídica, o Governo Central da Federação; e finalmente, o
Princípio da não Positivação, ou da legislação negativa, evitando-se, pois,
positivar o que não se deve: o dinamismo da vida e da evolução social. A
costura final, protege a Constituição dos políticos da representação federal: uma
cláusula que só permita que uma PEC vigore a partir da ratificação de 4/5 dos
estados federados, tendo o Presidente da República a obrigação única de
homologar a vontade da Federação.
Da visão pessimista
do atual texto, pela realidade que infelizmente se impôs, a reflexão expressa
na proposta de um novo texto aponta para a ainda presente possibilidade de o
País se tornar governável, democraticamente, constituindo-se então, em uma
Sociedade justa, próspera e aberta para a evolução do mundo, saindo da velocidade
da carroça para a velocidade dos gigabytes, uma escolha preferencial pela
soberania como player, deixando de ser marionete de interesses internos de
poucos e externos dos que se aproveitam da fragilidade ampla, geral e
irrestrita de um país centralizado e concentrado nas suas tacanhas
idiossincrasias. Está na hora de deixar as picuinhas do varejo dominarem
as estratégias do atacado. Varejo é com a localidade. Que tenha autonomia para
tal.