quinta-feira, abril 11, 2013

QUANDO O POVO SOUBER DA VERDADE...




“Antiquus pullum scandere novit eques”
                                                    (Para cavalo novo, cavaleiro velho – autoria desconhecida)


Em matéria publicada na Folha (http://www1.folha.uol.com.br/colunas/aecioneves/1258942-causa-federativa.shtml) titulada “Causa Federativa” o candidato cada vez mais candidato Aécio Neves ataca a concentração de poderes e a distribuição de recursos da União aos estados e municípios, causando ao incauto, nítida impressão da defesa de uma Federação renovada. Mas, como ele mesmo afirmou no início de seu artigo, “Federação nem sempre é um tema bem compreendido”.

Para ajudar o leitor daquela matéria, vários nos consultaram a respeito, tomei a liberdade de fazer um contraponto, cuja verdade poderá soar como toda verdade, uma insolência. O que Aécio defende não é federalismo pleno, é um redimensionamento da repartição as receitas dentro do modelo federativo unitário brasileiro.

Vamos às diferenças cruciais:

MODELO FEDERATIVO -  o que Aécio defende - é "um modelo mais solidário, participativo, movido pelas responsabilidades compartilhadas entre as esferas de governança". Ou seja, a manutenção do modelo de arrecadação centralizada com a manutenção da redistribuição - o tal compartilhamento, palavra bastante utilizada nas redes sociais – bonita,  portanto.  A expressão  "participativo" soa vaga, remetendo, em um primeiro raciocínio lógico, a permanência do modelo de transferências dos estados do Sul e Sudeste, de mais e mais recursos para compensar os déficits estruturais de estados mais pobres. O "solidário" dá um fechamento eufemista, político, “fraterno”,  realmente “tocante”, mas sem fundamento econômico e prático do ponto de vista dos resultados esperados pela população no médio e longo prazo. Afinal, a solidariedade pode ser entendida também com a manutenção de todo o modelo que sustenta muita gente, das três esferas de governo e dos Três Poderes. Solidariedade com o dinheiro do cidadão... estaria o cidadão solidário a isso?

A tal da "responsabilidade compartilhada entre as esferas de governança" é mais uma bela expressão que significa, no fundo, a integração total que já vem ocorrendo das três esferas de governo, especialmente com a Receita Federal. Aliás, a Super Receita Federal, cada vez mais super... Ninguém mais obtém um alvará sem que o CNPJ, de emissão federal, seja entregue juntamente com o documento de emissão municipal, mas este não é entregue se existir qualquer obrigação, inclusive acessória, simples que seja, por parte do cidadão, junto a qualquer esfera governamental (Governo Federal, estadual ou municipal), de qualquer parte do País. Ao se pensar em meia dúzia de pilantras se pune toda uma população de 200 milhões de pessoas.

O candidato ao Planalto em 2014 discursa corretamente com os números e a concentração de poderes e de recursos, mas a leitura correta, atenta, poderá ser traduzida facilmente pela manutenção do mesmo, falando do mais. Outro exemplo que demonstra isso está na frase: "Temas aparentemente tão distantes como a mudança da legislação do ICMS, a revisão do Fundo de Participação dos Estados, a renegociação das dívidas dos Estados com a União, a partilha dos royalties ou o novo marco sobre a exploração mineral podem impactar profundamente a vida dos brasileiros, embora nem todo mundo se dê conta." Note-se a manutenção do mesmo Fundo de Participação dos Estados, a mesma ladainha em relação ao ICMS, renegociação de dívidas  dos estados dom a União (sic), partilha de royalties de um petróleo que nem foi alcançado ainda, e ainda um novo marco nacional sobre a exploração mineral - ou seja, tudo se mantém com a União.  Nova roupagem para o mesmo conteúdo, agora, federativo. Ou, como o ditado latim, o mesmo cavalheiro velho para um cavalo novo.

Isso tudo me faz lembrar daquele quadro no Casseta & Planeta do rapaz trajando cueca de couro e afirmando peremptoriamente não ser gay. Chico Anísio também brincava com essa ambiguidade. E a política no Brasil é isso, ambiguidade.

MODELO FEDERALISTA -  Em uma federação de verdade, estados não devem à União. Estados fazem sua legislação fiscal livremente. Não existe Fundo de Participação dos estados, nem de municípios. Os royalties de minerais e até da pesca explorados dentro de um limite geográfico - nos EUA é de 12 milhas náuticas - pertencem aos respectivos estados e além disso, aí sim, à União, respeitando-se os limites internacionais.

Em uma Federação ampla, de autonomias estaduais e municipais, cada estado tem liberdade para fazer suas leis, adotar alíquotas próprias para tributar o que considerar justo, assim como municípios têm liberdade até para definir se continuam a pagar uma camara de vereadores ou se adotam uma câmara de conselheiros não remunerados, ou remunerados parcialmente, ou por comparecimento. Cada cidade deve decidir. Nunca Brasília. Nem pela Constituição, como pretende uma PEC que quer "canetear" todas as câmaras de cidades com menos de 50 mil habitantes. Uma medida aparentemente saneadora, mas absolutamente errada na forma, antidemocrática, porque cada cidade tem sua característica e a democracia implica no poder de decisão de quem paga a conta - no caso, o povo de cada localidade.

A Federação plena de autonomias deixa para o Governo Central apenas tarefas essencialmente de interesse nacional, tais como, a Moeda, as FFAA, as Relações Externas, Uma Corte Suprema e secretarias para temas como pesos e medidas, propriedade intelectual, finanças, seguros, ou seja, normas gerais de assuntos que não invadam a competência dos estados e que tais competências não criem países dentro da Federação. Pesos e contrapesos.

Não existe, portanto, nenhuma possibilidade de reforma séria do modelo atual se não se passar pela descentralização e multiplicação dos centros de poder. A ampliação do tamanho das migalhas da União aos estados e municípios não deveria sequer ser chamada de "revisão de pacto federativo", pois isso até mereceria um processo contra propaganda enganosa.

O exemplo disso se consubstancia no encerramento do artigo do candidato mineiro: "É um alicerce para a construção de um país menos desigual. Recuperar os valores que a sustentam e equalizar direitos e deveres entre as esferas de governo é mais que uma tarefa política." Ora, uma federação é a soma das desigualdades. Não é a desigualdade que deve ser combatida, porque isso significa tirar de um para dar para outro na busca da equalização, quem conhece a Teoria de Pascal, dos Vasos Comunicantes, sabe como isso funciona. Há que se criar oportunidades iguais para todos, aceitando-se que o mérito premiará os que mais trabalharem, os que mais forem competentes, os mais criativos, tudo isso em qualquer área, da indústria às artes, da agricultura ao esporte, é isso que motiva o progresso humano. Afinal, quantos Neimares, Pelés, Ronaldinhos, etc, existem? Se o termo "desigualdade" tivesse alguma aplicação por decreto (vade retro!), certamente esses talentos, assim como outros em outras áreas, seriam punidos por serem melhores, se destacarem, e seriam proibidos de fazer salários melhores do que um perna de pau de um time de várzea.

Finalmente, o que é necessário equalizar, não como o candidato Aécio expressa, é o conhecimento amplo, geral e irrestrito de todos os brasileiros sobre os princípios da verdadeira federação, dos benefícios do Poder Local, atrelados à Responsabilidade Local. Einstein dizia que nenhum cérebro que aumente de tamanho pelo incremento de conhecimento tem condições de voltar ao tamanho anterior. Quando o Povo Brasileiro souber da verdade, o Brasil despertará finalmente, o gigante pela própria natureza, anestesiado em berço esplêndido pela simples ignorância da verdade.